sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012




Eu não me lembro quando eu parei de pensar, e eu realmente não me lembro quando eu parei de sentir, mas isto ocorreu há muito, muito tempo atrás. Este estado de abençoada segurança cresceu com os anos, o pescoço tornou-se uma mera linha, um pedaço de corda tencionada até o ponto de estrangulamento, enrolada ao redor da única passagem para o respiro do ar, para dar  vida ao coração. Você vê, eu comecei a olhar somente de cima para baixo e o canal estancou  na corda em volta do pescoço!  Nada foi para baixo e nada veio das profundezas do coração, da alma. Não houve mais misturadores para água quente e fria, não houve mais medidas para o rum e a coca-cola. A fumaça do cigarro amava exatamente isto, paralisando-se nas dobras do coração da garganta, incapaz de ir para baixo e incapaz de voltar e sair. Tudo isto inchou  suavemente, duplicou-se em células e o câncer nasceu. Esta era uma situação ideal para não conversar mais, não haver mais comunicação. Por que se comunicar depois disto tudo, quando a alma é separada da mente e a mente da alma? Isto era absurdamente conveniente.
I don´t remember just when I stopped thinking, nor do I  recall  when I  just stopped feeling, but it all happened a long, long time ago. The state of blessed security grew as the years went by, my neck became merely a fine line, a taught piece of string tightened to the point of strangulation around the only passage of air to breathe through, to give life to my heart. You see, I started to see only from top to bottom, the channel closed at the point where the string wrapped itself around my neck and throat! Nothing would go further down, and nothing was able to surface from the depths of my heart, my soul. There were no more mixer taps for the hot and cold water of the mind and spirit to mingle, nor spirit levels for measuring the right amount of rum for the rum and cokes. The cigarette smoke was in it´s full element, rolling and languishing in the folds at the heart of my throat, unable to delve into deeper depths beyond the throat and unable to back-track and expel itself from the organism. Slow but gradual swelling, multiplication of cells,  the cancer was born,  an ideal situation for stalling conversation,for severing all communication. Why communicate after all, when the spirit is so divorced from the mind, and the mind from the soul? All so absurdly convenient.

Reis e Rainhas



A alma das montanhas não mais conversava como antigamente com os espíritos da floresta e, para completar o circuito, os reis e as rainhas da costa que se originavam das sementes trazidas pelo vento e dos vestígios do interior completavam o círculo do silêncio. Não houve mais conversação ou diálogo, somente antagonismo e ódio, a matéria-prima que o câncer necessitava para florescer.


The Spirits of Mountains no longer converse  with the Spirits of the Forests like they used to in the ancient days. The Kings and Queens of the coastal plains born from the seeds blown in by the winds and remains of the hinterland complete the circle of silence. No more conversation or dialogue, only antagonism and hatred, the basic raw materials needed for a cancer to blossom and flourish.

Crianças



Uma criança caminhava através da floresta de concreto, as lâmpadas dos postes lembrando-a dos coqueiros dos seus primeiros dias, antes de aprender a falar. O Sol incandescia no alto, antes que a Lua começasse a brilhar e, quando a Lua aparecia, ele falava com o Sol sobre as horas minguantes  e com o calor da Terra sobre a liberdade do tempo. Todos começavam a conversar, a trocar suas experiências, a falar sobre suas sensações. Eles construíram uma passagem subterrânea para as profundezas da Terra do Fogo juntar-se ao canal do Panamá e, sobretudo, eles falaram sobre suas histórias, suas raízes étnicas, suas linguagens, e descobriram que uma vez que eram capazes de se comunicar, eles eram um só. Oh, naturalmente eles eram ligeiramente diferente ao olhar, mas eles descobriram que eram capazes de transformar lâmpadas em árvores. A mágica estava em cortar as cordas que serpenteavam ao redor dos seus pescoços, estrangulando a conversa entre eles. Se assim não fosse, como eles poderiam conversar com os outros? Agora eles são capazes de respirar profundamente o ar ao redor deles e enviá-lo gentilmente ao Sol, à Lua, à Terra e todas as suas crianças. Olhemos brevemente no espelho e vamos imaginar que estamos novamente dando nossos primeiros passos, falando em nossos primeiros contextos, respirando em uníssono, comunicando de fato.

A child walked through the concrete forest, the lamp-posts reminding him of the coconut trees during those first days before he learned to talk. The Sun raged from high, this before the Moon began to shine and, when the Moon appeared she spoke to the Sun about the waning hours and with the heat of the Earth she spoke about the Freedom of Time. They all began to talk together, to exchange experiences, to speak of their sensations. They built an underground passage to link the depths of Tierra del Fuego to the Panama Canal, and above all they told their stories, of  their ethnic roots, their languages, and they found that once they were able to communicate, they were all alike, a single being. Oh, of course they were slightly different to look at , but they all discovered  alike, they were all able to transform lamp-posts into trees. The magic was in cutting the bonds which snaked around their necks and throats strangling the conversation between them. If this were not so, how then could they speak with others? Now also they were able to breathe in deeply the air around them and remit it gently to the Sun, to the Moon, to the Earth and all her children. Let us now look briefly into a mirror and imagine we are taking our first steps in learning to walk, speaking of our first contexts, breathing in together in harmony, in fact communicating.